maio 1, 2020

Francini Fabre

Pensar modifica a estrutura do cérebro (Quadro dos sonhos)

É fácil aceitar a ideia de que a prática de exercícios aumenta o tamanho dos músculos e que a atividade cerebral leva ao acúmulo de conhecimentos em nossa mente. Apesar disso, a maioria das pessoas não acredita que o simples ato de pensar possa alterar a estrutura cerebral. Um dos experimentos clássicos que demonstram esse fenômeno envolve o aprendizado da arte de tocar piano.

No cérebro existem duas áreas que controlam o movimento dos dedos, uma para cada mão. O tamanho delas, que reflete o número de neurônios envolvidos na tarefa, pode ser medido usando-se um equipamento capaz de detectar a atividade elétrica na região. Foi com esse equipamento que os cientistas decidiram verificar o que ocorria quando uma pessoa aprendia a tocar piano. Pediu-se a um grupo de voluntários que praticasse, duas horas por dia, durante cinco dias, uma sequência de notas que exigia a utilização dos cinco dedos da mão direita. O objetivo era não cometer erros e seguir o ritmo de um metrônomo. Em cinco dias todos os “alunos”, que inicialmente haviam trocado as notas e errado o ritmo, mostraram-se capazes de aprender a tocar a sequência sem erros e no ritmo do metrônomo. Todos os dias media-se o tamanho da área do cérebro responsável pelo controle dos movimentos dos dedos da mão direita. À medida que as pessoas melhoravam sua habilidade ao piano, a área que controla os movimentos da mão direita foi aumentando, enquanto a área responsável pelo controle da mão esquerda não se alterou. Isso demonstra que quando utilizamos intensamente uma área do cérebro nela ocorrem modificações de modo a acomodar a nova tarefa.

Não satisfeitos, os cientistas resolveram verificar se é necessário executar o movimento para que as alterações ocorram ou se basta imaginá-lo. Nesse experimento os voluntários foram submetidos à mesma rotina, mas instruídos a deixar as mãos imóveis sobre a perna e somente imaginar que estavam tocando com a mão direita, enquanto ouviam o metrônomo e olhavam para o teclado, tudo sem mover os dedos. Para garantir que não movessem as mãos, foram colocados eletrodos que alertavam os cientistas se os voluntários tentavam mexer os dedos. Depois de praticarem mentalmente durante cinco dias, duas horas por dia, a área que controla os movimentos foi medida. O surpreendente é que a área do cérebro que comanda a mão direita aumentou de tamanho mesmo na ausência de movimentos, demonstrando que somente o ato de imaginar o movimento dessa mão foi capaz de alterar a estrutura cerebral.
Como era de se esperar, não foi observada nenhuma alteração na área que controla a mão esquerda. Esse experimento foi um dos primeiros a demonstrar que o simples ato de pensar intensamente e de maneira repetitiva pode provocar alterações na estrutura do cérebro.

As implicações dessa descoberta são enormes. Atualmente muitos cientistas acreditam na possibilidade de utilizar exercícios mentais para modelar nosso cérebro da mesma forma que utilizamos as academias para modelar nossos músculos. Ainda não se sabe se tais técnicas se mostrariam efetivas no tratamento de doenças mentais.

 

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Mais informações em: “Modulation of muscle responses evoked by transcranial magnetic stimulation during the acquisition of new fine motor skills”.
J. Neurophysiology, vol. 74, p. 1037, 1995.
REINACH, Fernando. A longa marcha dos grilos canibais – pag. 178-180
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